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Mindfulness – um antídoto contra o stress

 Mindfulness é uma palavra inglesa empregada para traduzir “sati”, um termo pali, que significa “atenção, consciência e recordação”.

O Mindfulness, tal como referia Ronald Siegel, é uma maneira de nos relacionarmos com a vida. Uma atitude perante a existência que nos oferece a promessa de aliviar o nosso sofrimento e de converter a vida numa realidade rica e plena de sentido.

Sabemos que a vida acontece agora, neste momento. Que o lugar onde estamos, é o único que existe. A mente leva-nos constantemente ao passado, recordando quer momentos de crise, dor e erro quer momentos de felicidade, alegria e plenitude, e leva-nos também ao futuro, antecipando cenários possíveis, mas inexistentes, e possibilitando-nos sentir medo e ansiedade pelo que ainda está por vir… ou que nunca virá. É esta evasão constante do momento presente, que nos impede de lidar com aquilo que é real e que, em última instância, nos impede de sentir e saborear a vida.

Ao treinarmos a atenção, ganhamos tempo. Ao ganharmos tempo, ganhamos liberdade de escolha. Quantas vezes nos encontramos em situações onde a origem do conflito tem raízes nas expressões “não me dei conta”, “não me apercebi”, “se tivesse visto”? Ser conscientes do que fazemos, enquanto o estamos a fazer, ser conscientes do que sentimos enquanto o estamos a sentir, ser conscientes do que pensamos enquanto o estamos a pensar, é um treino contínuo que traz mudanças efectivas ao nosso quotidiano, às nossas relações, ao nosso trabalho, ao nosso mundo interior e exterior.

Numa publicação da Comissão Europeia sobre o stress, com o subtítulo “O sal da vida ou o beijo da morte”, referia-se que “quando consideramos que somos donos da situação, o stress converte-se no sal da vida, num desafio e não numa ameaça. Quando nos falta esta sensação, o stress pode supor uma crise, o que se torna mau para nós, para a nossa saúde e para a nossa empresa. Se vivemos assim o nosso trabalho quotidiano, isso irá afectar tudo à velocidade a que se produzem os processos corporais de desgaste: isso é o beijo da morte.

Na verdade, a medida certa de tensão interior é aquilo que nos permite permanecer ativos e criativos, ser agentes de mudança e atingir objetivos. Esse stress só se torna negativo quando nos causa uma tensão para além dos limites, desencadeando uma alteração fisiológica e psicológica que nos paraliza, subjuga e dificulta a vida.

Um maior grau de atenção e de autoconhecimento permite-nos avaliar se as ameaças que nos causam stress são reais ou apenas resultado das nossas percepções enganosas; permite-nos sair dos “enredos”, dos filmes repetidamente vistos, das interpretações negativas, dos medos e ansiedades de poder ver como futuro uma realidade que nos causou dor no passado. Ao reduzirmos o peso da mochila de experiências que carregamos, começamos a perceber nas entrelinhas o sentido da vida, a ver portas de oportunidade onde antes víamos muros limitadores, a olhar para fracassos e a ver caminhos de aprendizagem e crescimento.

Segundo dados da OMS (2010), as doenças crónicas relacionadas com o stress (doenças cardíacas, cancro, depressão ou ansiedade) são a principal causa de morte nos países desenvolvidos. Tornou-se um desafio global procurar soluções no sentido de melhorar as capacidades psico-emocionais para lidar com o stress, melhorar a atenção e auto-regular os pensamentos e as emoções negativas.

Viver, comporta inevitavelmente dor. E quando nos referimos à intervenção através das práticas de Mindfulness, não estamos a tentar mudar o inevitável, ou seja, eliminar a dor, mas sim, em alterar a forma como (re)agimos quando ela entra na nossa vida.

Buda falou-nos na existência de “duas flechas”: a primeira flecha, como o acontecimento doloroso em si mesmo, que teve lugar e que não é possível evitar; a segunda flecha, como aquela que somos nós mesmos a disparar, e que é opcional. O sofrimento é portanto uma escolha, uma reacção à dor inevitável da vida. E esse sofrimento pessoal pode acrescentar ao estado inicial, outros estados como a ansiedade, a depressão, o medo, a confusão, a tristeza, a raiva, a frustração, etc.

Quando se faz referência a algumas práticas oriundas do oriente, como é o caso da meditação e mindfulness, pode-se ficar com a ideia de que a quietude espiritual é a melhor resposta: não sentir demasiado, não se entusiasmar nem se zangar demasiado… em última instância, não viver demasiado. Mas ser Mindfulness não é corresponder a um perfil muito estreito do que é “bom”, “elevado” e “luminoso”, ignorando, reprimindo ou negando, tudo aquilo que somos e sentimos num dado momento, mas que preferíamos não sentir, não ter e não ser, pois não corresponde à lista de virtudes anunciada. Percorrer esse caminho da rejeição é consumir-se interiormente “em fogo lento” e esperar a explosão tardia.

Estar atento e presente, e sentir a emoção, também não é reagir de acordo com ela. Seguir os nossos impulsos, de forma automática, pode levar-nos também a ser marionetes de emoções ditadoras, reforçando comportamentos onde se expressa apenas a força bruta.

Mindfulness é mais do que isso, é aceitar o que existe tal e qual como existe. É reconhecer a emoção, sem juízo, permitindo-se sentir mas sem se perder nela; É um assumir da responsabilidade pessoal na condução da própria vida, saindo do papel de vítima das circunstâncias, da má sorte ou do karma. Uma dança entre a responsabilidade e a liberdade que reduz a sensação frequente de que “a vida passa por nós” e abre espaço para sentir que somos nós “quem passamos pela vida”.

Um terço da nossa vida é passado a dormir ou descansar, o que perfaz cerca de 25 anos. Outro terço é dedicado a atividades como comer, esperar, deslocar-se para o trabalho. O outro terço é para aprender, relacionarmo-nos, criar ou cuidar.  Qual o nosso grau de atenção em cada um deles? Onde nos sentimos responsáveis, livres, presentes? Onde estamos a deixar a nossa marca, única e irrepetível? Estás a sobreviver ou a viver? O que esperas?

“Durante muito tempo parecia que a vida estava a ponto de começar; a vida de verdade. Mas havia sempre algum obstáculo no caminho, algo para resolver primeiro… Depois a vida iria começar! Até que me dei conta de que estes obstáculos eram a minha vida.” Alfred Souza

Viver é uma arte que requer tempo, compromisso e amor.

Algumas pílulas Mindfulness contra o stress:

1.      Ao acordar, dá-te tempo para dar atenção ao corpo, fazendo um breve scanner.

2.      Enquanto tomas banho, dá-te conta se estás a pensar, a antecipar e organizar o teu dia, e traz a tua mente de novo ao presente. Utiliza os sentidos, sente o cheiro do sabão, a água sobre a tua pele, …

3.      Se vives com alguém, não saias de casa sem aproveitar para falar ou escutar atentamente por uns instantes.

4.      Não te apresses para chegar a casa, pensando que irás desfrutar quando chegares: agora é o momento de desfrutar.

5.      Come de forma lenta, tornando-te consciente do sabor e textura da comida.

6.      Faz pequenas pausas entre tarefas e respira de forma consciente.

O Mindfulness:

– Não é deixar a mente em branco

– Não é uma técnica de relaxamento

– Não é pensamento positivo

– Não é renunciar às emoções

– Não é entrar em transe

– Não é afastar-se da vida

– Não é procurar a beatitude ou um estado prazeroso de paz

– Não é evitar a dor

– Não é praticar uma nova religião

– Não é apenas para monges ou monjas

 
 

Artigo publicado na Revista Nova Era

VANESSA OLIVEIRA
DIRECÇÃO EDT

 

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