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Entre | Linhas | Entrevista com Vanessa Oliveira

“As pequenas coisas? Os pequenos momentos? Eles não são pequenos.

Jon Kabat-Zinn

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Usando apenas 10 palavras, descreve-te a ti mesma…

Aventureira, profunda, intensa, entregue, perseverante, silenciosa, sonhadora, intuitiva, generosa, com sentido de humor.

Qual era o teu sonho em criança? De que forma o cumpriste?

Em criança tinha uma imaginação muito fértil e as vontades e sonhos eram muitos. Lembro-me da lista infindável: desde querer ser cowboy, ranger, motard – ao estilo “Harley Davidson”, fazer atividades radicais, lidar com animais selvagens ou até andar pendurada nos camiões do lixo; De forma mais persistente, ser detetive, alquimista, repórter fotográfica, escritora e terapeuta.

O que estava na base das coisas acabou por cumprir-se com outras “vestimentas”. Esse lado mais livre, radical, aventureiro, “selvagem”, cumpro-o essencialmente nas viagens que realizo; A paixão pela fotografia e pela escrita continua viva e são as minhas formas favoritas de captar a beleza inerente a tudo, a alma das pessoas e o espírito dos lugares; E o impulso “detetivesco” – amante inflamado do Mistério, da investigação e do processo de descoberta – é, a par com a alquimia, presença assídua na sala de terapia.

O que te inspira?

A beleza que reconheço nas pessoas, nas coisas, nas circunstâncias, no mundo visível e invisível. Inspira-me a profundidade que conseguimos alcançar e a promessa de que nunca a conheceremos na sua totalidade. Inspiram-me os pequenos “milagres” do dia-a-dia, aqueles que tantas vezes passam despercebidos. Inspira-me a capacidade das pessoas para criar, os seus diversos dons, tudo o que fazem quando lhe põem coração. Inspira-me a fraternidade, a entre-ajuda e o espírito de “não deixar ninguém para trás”. Inspira-me a humanidade, o sagrado, a magia e tudo aquilo que me possa ir revelando um pouco mais sobre o que a Vida É.

Em que é que confias?

Confio na Vida e no Mistério. E com isto não quero dizer que confio que eles me irão proporcionar tudo o que eu quero, ou que são aquilo que eu necessito que eles sejam. Não os quero pintar com outras cores… confio neles, precisamente, porque não são adulteráveis, porque não respondem a caprichos, são fiáveis na sua essência, e são infinitamente maiores do que toda a imaginação que cabe em nós.

Porquê a EDT?

Porque quando surgiu na minha vida e me foi apresentada a proposta para a trazer para Portugal, eu tinha um SIM ardente dentro do peito e os olhos iluminados por essa possibilidade. Tinha encontrado um lugar integrador, onde podíamos descobrir e expressar tudo, sem olhares redutores. Um lugar onde a perspetiva e experiência pessoal tinham tanto ou mais valor do que as mil e uma teorias existentes. Onde se olhava para dentro para obter respostas e não se debitavam fórmulas de como viver melhor. Um lugar que não estava feito para a superficialidade e que nos convidava, uma e outra vez, a atravessar terrenos “pantanosos” e também a subir e a experimentar o topo da montanha. Um lugar onde Ser quem nós éramos, bastava.

Tinha vivido tanto, tinha enriquecido tanto que, apesar das inseguranças e dos desafios que antevia, não consegui vislumbrar outro caminho que não esse – o de ser um meio para levar esta experiência a mais pessoas. Porquê a EDT? Por tudo isto. Pelo sonho, pela inspiração, pelo significado e pelo sentido. Este projeto agora pertence a muitos e é uma benção ver como é nutrido com o coração, a arte, o engenho e o suor de pessoas excepcionais. 

Se só pudesses deixar uma frase como legado, com as tuas próprias palavras, o que dirias aos outros?

Descobre aquilo que verdadeiramente importa e entrega-te inteiro/a, de corpo e alma. Não adies, não desperdices, não te distraias.

O silêncio trás-me…

Sanação. É essencial para a restauração do meu equilíbrio, para um “processamento” profundo da própria vida e para uma redução do ruído superficial, que pouco me acrescenta e muito me distrai.

Traz-me também um enorme sentido de intimidade, intimidade real comigo mesma, com as várias partes de mim – que aí encontram tempo e espaço para se revelarem.

O silêncio liga-me a algo maior do que eu, abre-me a mais possibilidades, ensina-me a olhar com mais qualidade amorosa e mais discernimento, mostra-me o que tem valor, e acolhe-me sempre, sempre, sem me exigir nada de diferente do que aquilo que sou e tenho. O silêncio traz-me Alma e é uma chave para a vivência do verdadeiro amor próprio.

Hoje, fazer algo com coragem seria…

Pelo que vou conhecendo da vida, os atos de coragem são, na maioria das vezes, bastante simples e sem aplausos. Pode ser apenas levantar-se e “fazer o que precisa de ser feito”; ou dizer coisas importantes a pessoas importantes – o quanto as amamos, um “obrigada”, um “desculpa”, aquilo que sentimos de forma real e mais além dos idealismos, aquilo que sonhamos, que nos amedronta, ou em que lugar estamos; Ás vezes coragem é “virar a mesa” e outras vezes é pô-la e convidar alguém para jantar; Às vezes é agarrar e outras vezes é soltar; É ouvir e seguir a Voz da Alma, mesmo quando isso significa virar do avesso os planos que temos para a vida. Hoje, poderia fazer qualquer uma destas coisas, porque todos os dias são dias (perfeitamente) inacabados e há tanto em nós para entregar ao mundo.  

Que personagem de um filme ou livro gostarias mais de conhecer? Porquê?

Gostava de poder conhecer os guerreiros Na’vi do filme Avatar. Porque me encantou o mundo de Pandora, o nível de ligação que tinham com a Natureza, com tudo o que os rodeava. Comovente a existência da Árvore das Almas e o nível de consciência coletiva que foi aí tão bem retratado. 

Como defines o sucesso e como irás saber que o atingiste?

O sucesso, para mim, é a arte de estar bem na vida e com a vida. É saber que se está a aproveitar cada momento, desfrutando das coisas simples e grandiosas do mundo – desde assistir ao nascer e pôr do Sol, a sentir o sal na pele depois de um mergulho no mar, ao vento morno numa noite de verão, o som de risos e conversas entre pessoas afins, uma mesa de petiscos que convide a “ficar”, o crepitar da lenha na lareira, o cheiro do pão acabado de sair do forno, a eternidade contida nos momentos de intimidade;
É realizar e persistir nas coisas que nos encantam a alma e nutrem o espírito; é criar laços honestos, lugares seguros, onde possamos encontrar-nos sem filtros e perceber a bênção que é estarmos vivos; é espantar-se com a forma como os caminhos se cruzam.
Sei que atingi o sucesso se me levantar de manhã com entusiasmo, se me expressar e dedicar ao que me apaixona, se for útil para alguém, se sentir prazer… no fundo, se chegar ao final do dia com a sensação de que “valeu a pena”.

Qual a característica familiar que herdaste e que mais te apoia na Vida?

Apesar de serem várias e de as características terem sempre duas faces, como as moedas, creio que escolho a resiliência – é algo que faz parte do legado familiar e tem sido, definitivamente, uma fonte de apoio diante dos “picos e vales” da vida.

O que é que sempre te faz vir as lágrimas aos olhos?

Bater com o dedo mindinho do pé numa qualquer esquina de móvel 🙂  …
Fico com os olhos marejados sempre que vejo exemplos de bondade e exemplos de coragem; sempre que as pessoas se unem em torno de um propósito comum e conseguem realizar coisas extraordinárias; sempre que alguém se comove ou se vulnerabiliza e permite que se aceda à beleza e à grandeza da Alma; sempre que as pessoas tentam mostrar a quem amam, que as amam, seja por palavras ou atos, e com a verdade escrita no olhar; sempre que me deparo com os olhos pequeninos e brilhantes das pessoas mais velhas, cheios de estórias, cheios de tempo; e sempre que me rio, com uma inegável e inesgotável vontade.

 

 

 

ENTREVISTA A VANESSA OLIVEIRA
DIREÇÃO EDT